À primeira vista, parece que a força dos projetos de arquitetura das lojas da Apple são uma mera consequência da qualidade do design de seus produtos. Entretanto, desde que Steve Jobs inaugurou a primeira Apple Store em 2001, a gigante americana da industria da tecnologia mudou seu conceito de projeto de arquitetura e também de iluminação, pelo menos, cinco vezes. Desta maneira, parece que a medida que uma marca cresce e se expande no mercado internacional, novos ares e novas ideias são mais do que apenas um desejo, mas uma necessidade para que ela possa manter sua posição no mercado. Em cada um destes períodos conceituais que guiaram os projetos das suas lojas, a Apple fez uso de detalhes e sistemas sofisticados em busca de um projeto de iluminação perfeito - uma estratégia fundamental para aprimorar a qualidade ambiental destes espaços assim como a sustentabilidade e eficiência de suas lojas.
Sistemas embutidos de iluminação e luz sóbria
A primeira geração das lojas da Apple seguiu um conceito de painéis modulares de forro com sistemas de iluminação embutidos, introduzindo assim a aparência pela qual as lojas da Apple ficaram mundialmente conhecidas. Nesta fase inaugural, os painéis de forro luminoso nos fazem lembrar de um dia de céu nublado. Hoje, esta estratégia dificilmente pode ser associada à um visionário do mundo da tecnologia e muito menos à computadores sofisticados, ela nos lembra mais um projeto de arquitetura retrô, evocando o tradicional espaço corporativo da segunda metade do século XX. Entretanto, quando as empresas passaram a se preocupar mais com questões ligadas à sustentabilidade e ao conforto ambiental no espaço de trabalho, este conceito de projeto de iluminação deixou de ser relevante.
Luz natural em ambientes subterrâneos
O mais notável projeto da segunda geração das lojas da Apple é o cubo de vidro da Quinta Avenida na cidade de Nova Iorque (2006), o primeiro de uma duradoura parceria entre a Apple e o arquiteto Bohlin Cywinski Jackson. Inspirado pela famosa pirâmide de vidro projetada por I.M. Pei na reforma do Louvre de Paris, Steve Jobs idealizou um cubo perfeito de cristal como símbolo da mais importante loja da empresa que ele ajudou a fundar. A incorporação da iluminação natural tornou-se ainda mais dominante nos seguintes projetos construídos pela Apple, como na reforma da loja de Palo Alto (2012), a qual conta com uma cobertura de vidro em arco. Entretanto, o brilho excessivo da luz do sol no interior destes espaços passou a ser, em alguns casos específicos, um problema. Como consequência disso, para o projeto da loja em Istambul (2014) a ideia foi criar uma lanterna de vidro, minimizando o ofuscamento no interior do edifício, já para a loja da Apple em Milão (2018), a criação de um grande pátio rebaixado amplia a iluminação natural dos espaços da loja evitando utilizar apenas as aberturas zenitais, responsáveis pelo ofuscamento. Mas nem sempre há espaço suficiente para poder aplicar estratégias como esta, portanto, a Apple desenvolveu maneiras alternativas para criar um efeito comum e uma atmosfera característica para todas as suas lojas.
Uniformidade para uma atmosfera serena
Em 2014, em parceria com a Foster + Partners, Apple lançou um novo conceito de projeto de iluminação: grandes superfícies de forro luminoso dimerizável e livres de juntas. como consequência disso alcança-se um brilho suave e uniforme, criando uma atmosfera serena no ambiente das lojas. De forma complementar, foram adicionados pontos de iluminação de tarefa para realçar os itens dispostos na loja, uma série de spots instalados sobre trilhos paralelos. A primeira loja desta nova geração foi aberta em Istambul, em combinação com o conceito de lanterna luminosa que incorpora a luz do sol durante o dia. A loja de Hangzhou (2015), por sua vez, aplica o conceito de forro luminoso em seus dois pavimentos, criado uma impressionante experiência de vitrine de dupla altura.
Uma das principais fontes de inspiração utilizadas pela Apple durante a geração de lojas com forro luminoso foi o projeto do domo do General Motors Technical Center projetado por Eero Saarinen em colaboração com o designer de iluminação Richard Kelly. Edifícios corporativos projetados por Skidmore Owings & Merrill, como o Manufactors Hanover Trust em Nova York (1954) ou a sede da Union Carbide Corporation em Nova Iorque (1960), estão entre os primeiros edifícios do mundo a utilizar este tipo de forro luminoso. No entanto, esta modalidade de projeto de iluminação, com uma superabundâncias de luz difusa, acabou sendo duramente criticado já na década de 1970, como bem destacou o arquiteto americano Der Scott: "Entre todos os sistemas de iluminação disponíveis atualmente, visualmente, o forro luminoso é o mais monótono deles."
Estilo Internacional x contextualismo
Não é de hoje que a Apple conta com uma estratégia universal para o projeto de suas lojas. Os conceitos de iluminação destes espaços chegam até a ser patenteados, o que fatalmente nos faz lembrar do que aconteceu com a arquitetura do chamado International Style, edifícios completamente desvinculados de seu contexto local específico. Com o passar dos anos, o mundo da arquitetura passou a olhar com mais cuidado os valores culturais locais, o que acabou sendo incorporado também nas estratégias de marketing da empresa. A loja da Grand Central de Neva Irorque (2011) ou a reconstrução do antigo ponto na Upper East Side (2015), fazem parte da primeira geração de lojas da Apple a incluir a arquitetura histórica e também luminárias como uma tentativa de incorporar elementos do contexto específico.
A partir deste momento, a equipe da Foster + Partners percebeu que também era importante incorporar elementos locais em sues projetos de arquitetura para as novas lojas da Apple. O sistema de proteção solar da Loja da Apple em Dubai (2017) é uma homenagem aos tradicionais padrões locais utilizados em seus Mashrabiyas ou Muxarabies. Por outro lado, a mais recente delas, a Loja da Apple na Champs Élysées de Paris (2018), faz referência a ornamentação do estilo Beaux-Arts característico da capital francesa.
Expansão Urbana
Ao longo dos últimos anos, o redesenho das principais lojas da Apple passaram a assumir um conceito mais "urbano", incorporando uma praça pública e projeto de iluminação exterior para criar um novo contexto urbano. A iluminação transpôs as suas fachadas de vidro para ser incorporada também nas escadas e no mobiliário urbano da cidade de Chicago, ou na Piazza Liberty da cidade de Milão, ou apropriando-se de uma fonte para assumir um importante papel na criação de espaços de encontro e socialização ao redor de suas lojas. Claramente, a Apple está passando por um momento no qual a tecnologia é utilizada para potencializar os efeitos de iluminação.
A recente reabertura da icônica loja da Apple na Quinta Avenida é um ótimo exemplo da estratégia de iluminação utilizada para criar uma atmosfera vibrante e natural, como Stefan Behling explicou em uma entrevista à Forbes: “Então, o que estávamos buscando com este projeto era: seria possível fazer com que as pessoas se sentissem à céu aberto mesmo no espaço interior da loja? Como nuvens brancas atravessando o céu azul, parece que conseguimos aquilo que queríamos.” A loja da Quinta Avenida apresenta uma incrível mistura de iluminação natural e artificial, com um forro luminoso que muda lentamente a temperatura da cor ao longo do dia e uma série de aberturas zenitais incorporadas no desenho do mobiliário urbanos do lado de fora.
Dito isso, percebemos que a luz tem sido um elemento fundamental na definição das estratégias de marketing da Apple assim como na promoção de sua própria imagem institucional. Ao olhar para a história dos projetos de lojas da Apple, fica claro que o desenvolvimento de novas estratégias e conceitos parecem muito mais importantes para o crescimento da Apple do que edifícios monumentais construídos para para durar séculos. Pavilhões transparentes, efêmeros, estruturas de madeira e sustentáveis. Edifícios que refletem o espírito de seu tempo, que se transformam ao longo dos anos e onde a iluminação emerge como um dos principais elementos responsáveis pela imagem corporativa da empresa.
A análise dos projetos de iluminação das lojas da Apple foi apresentada por primeira vez no Professional Lighting Design Convention realizado na cidade de Rotterdam em Outubro de 2019.
Light matters, uma coluna mensal sobre a luz e espaço, é escrita por Thomas Schielke. Residindo na Alemanha, Schielke é fascinado por projetos de iluminação de arquitetura além de trabalhar para a empresa de iluminação ERCO. Ele publicou diversos artigos e é co-autor do livro “Light Perspectives” and “SuperLux”. Para mais informações acesse www.erco.com, www.arclighting.de ou siga ele no twitter @arcspaces